29.7.17

Auto-controlada

Uma da memórias mais antigas que tenho é de estar à porta da cozinha, sem que os pés pisassem o mosaico desta divisão, toda inclinada para a frente para conseguir ver o meu pai que, junto ao forno ao fundo da cozinha estreita, espreitava os cannelloni. Lembro-me bem que não tinha autorização para entrar na cozinha quando o forno era aberto e por isso toda eu me tornava malabarista para, sem que os pés passassem o limite, a cabeça pudesse espreitar um dos meus pratos favoritos daquela altura.
Quando a Mini-Tété começou a movimentar-se e tendo muitas vezes de cozinhar sozinha com ela em casa, dizia-lhe para que saísse da cozinha quando queria abrir o forno, de forma a criar uma regra semelhante à usada na minha infância, para além claro do bom senso de que fornos e bebés não combinam e é coisa a evitar. Mas Mini-Tété levava aquilo como uma afronta, concluía que eu estava zangada com ela e que por isso a expulsava da cozinha, de nada adiantando que eu lhe explicasse que o forno é perigoso, que está muito quente, que ela tinha de ficar longe apenas uns minutos. Pior, magoada por a mandar afastar, tinha a tendência de vir na minha direcção, o que ia claramente contra o meu objectivo. Não foram poucas as vezes em que o Jack chegou a casa e encontou a porta da cozinha fechada, com uma Mini-Tété a chorar baba e ranho de um lado e eu de forno aberto do outro, a tentar ser rápida, para poder novamente dar livre acesso à cozinha à pequenita chorona.
Um dia, perante novamente a necessidade de abrir o forno, expliquei que teria de o fazer e perguntei-lhe para onde queria ir ela. Foi para junto do frigorífico, no lado oposto à porta, mas à mesma distância do forno. Expliquei-lhe que tinha de ficar muito quietinha enquanto eu mexia no forno e assim o fez. Há que dizer que tenho uma filha com muito pouca tendência para disparates, bastante cumpridora da maior parte das regras que lhe coloco, e este caso não é excepção. Cada vez que tenho de abrir o forno, aviso-a, ela encosta-se ao frigorífico e ali fica, a ver-me (e eu a deitar-lhe um olho porque não deixa de ser uma bebé de ano e meio, imprevisível como qualquer bebé), não se mexendo até eu lhe dizer "Já podes sair daí".
E esta tendência cumpridora da Mini-Tété é tão grande (e tão igual à da mãe), a minha filha é tão auto-controlada como eu sempre fui, que no outro dia enquanto fazia o jantar, ela foi para o seu lugar enquanto eu abria o forno. Fechei-o e continuei a preparar o jantar, cirandando pela cozinha, enquanto cantava e falava para com ela. A certa altura pergunta-me:
- Mamã, "já podes"?
E só nesse momento apercebi-me que não lhe tinha dito que ela podia sair do lugar depois de ter fechado o forno. E durante todo aquele tempo, enquanto eu ia e vinha, e falava e cantava, e ela me respondia, ela não se mexeu.
A Mini-Tété tem poucas regras nesta casa, anda por todo o lado, mexe em quase tudo, e acho que isso ajuda a que as poucas coisas que não pode fazer, sejam encaradas a sério por ela (com algumas excepções, claro, que a pequena não é um robot e também me desobedece de vez em quando). Mas sem qualquer dúvida que a personalidade ajuda muito. E neste caso, é tal e qual a mãe...

4 comentários:

  1. Isso é muito bom, uma menina como deve ser!

    ResponderEliminar
  2. Sim, não vou ter falsa modéstia e dizer que não há aqui também trabalho nosso (dos pais), mas é verdade que a sua personalidade ajuda muito.:)

    ResponderEliminar
  3. A personalidade dela pode ajudar muito, claro, mas isso é reflexo da educação que lhe dão :) melhor para a harmonia familiar!

    ResponderEliminar

Digam-me coisas. :)