Quem já não ouviu falar dos malditos emigrantes que chegados a terras lusas conduzem que nem os doidos? Sou sincera, à custa de ouvir estas coisas, também eu achava que era verdade. Ainda por cima, medricas como sou em relação ao carros e não confiando totalmente em todos os condutores, sempre achei que em carro de emigrante é que não punha o meu pézinho. E toma-que-já-te-lixaste porque não só não me apaixonei por um emigrante como ainda por cima ando de carro com a família emigrante. Devo dizer-vos desde já que esta história da má condução dos emigrantes é mais ou menos a mesma treta que a das mulheres ao volante serem um problema constante. Afinal de contas, os acidentes rodoviários, os atropelamentos e os pequenos choques não têm sempre mulheres envolvidas, da mesma forma que estas coisas não acontecem apenas durante os meses em que os emigrantes estão de férias em Portugal.
Para ser o mais clara possível, até afirmo: os portugueses não fazem a mais pequena ideia de como conduzir. É incrível a quantidade stops que passam sem parar, a rara utilização dos piscas, a confusão que algumas rotundas podem trazer, a difícil compreensão de cedências de passagem, o excesso de velocidade e as manobras arriscadas (para não dizer estúpidas). Tenho a sensação que se o país fosse todo submetido a um novo exame de condução, metade não recuperaria a carta. Não digo com isto que por exemplo os franceses saibam conduzir. Também não sabem. Aqui para a zona em que moro parece que estão sempre com o fogo no rabo e é vê-los a atravessar os campos como quem está numa auto-estrada. Não sei como é que não se despistam mais carros e não atropelam as vacas que por ali passeiam descansadas. Com os emigrantes passa-se o mesmo. Há os que conduzem bem e os que não fazem a pequena ideia de existe um código da estrada. Mas no fundo é sempre mais fácil culpar os emigrantes por algum acidente, assim como é mais fácil dizer "Pois, é uma mulher que vai conduzir!".
Nestas férias diverti-me a brincar com o Jack cada vez que íamos chocando ou que acontecia algum imprevisto. Dizia-lhe sempre "Malditos emigrantes, pah, vêm para Portugal e não sabem conduzir!", quando ambos sabíamos que a culpa não era nossa mas sim da outra pessoa. A brincar, a brincar, ainda apanhei um susto na véspera de partirmos quando um carro não fez cedência de passagem e nos ia arrancando metade do carro.
Da mesma forma, vejo os emigrantes a ter um cuidado com os carros que não vejo a maioria dos portugueses ter. Nunca vi iniciar ou iniciei uma viagem França-Portugal (ou vice-versa) sem que todos os carros da família que farão a viagem passem por um exame à pressão dos pneus, os vidros e espelhos bem limpos, confirmação de que todas as luzes acendem, o estado dos pneus, etc. Em Portugal há carros com os pneus carecas, luzes que não funcionam (eu por exemplo cheguei a andar sem saber sem as luzes dos travões), os vidros tão porcos que é impossível verem o que quer que seja, pneus em baixo, e são coisas como estas que podem estar na origem de um acidente.
É verdade que há emigrantes que conduzem muito depressa nas auto-estradas, mas eu também conheço portugueses que andam a 200 km/h e nunca emigraram. Da mesma forma já andei uma vez numa carro que, em plena cidade, atingiu os 120 km/h (acho que nunca mais entrei num carro conduzido por aquela pessoa). Passei a minha vida em Portugal a ver os portugueses a conduzir pior que animais, a ver acidentes nos telejornais e a ter medo dos outros condutores. Acredito sim que haja emigrantes que conduzem mal, que chegam a Portugal e provocam acidentes, mas é altura de se parar de falar da condução dos emigrantes como se a condução portuguesa fosse a melhor do mundo. Se os emigrantes deixassem de ir a Portugal os acidentes continuariam a existir, da mesma forma que se as mulheres parassem de conduzir, haveria na mesma mortes nas estradas. As ideias pré-concebidas de que são os outros que conduzem mal não vão ajudar ninguém.
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